sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Principais pontos da Medida Provisória n° 449/2008 destacados neste blog

Para facilitar a leitura e a pesquisa, informamos que os principais pontos abordados neste blog acerca das alterações introduzidas pela MP n° 449/2008 são os seguintes:

1. Inconstitucionalidade da vedação à compensção de IRPJ e CSLL estimativa

2. Inconstitucionalidade do art. 53: possibilidade da Receita Federal exercer reiteradas fiscalizações sobre o mesmo período de apuração, mesmo tributo e mesmo contribuinte

3. Redução das multas moratórias aplicadas pelo INSS em face da "retroatividade benigna"

4. Inconstitucionalidade e ilegalidade da proibição de distirbuição de resultados nas empresas em débito não garantido com a União

5. Impossibilidade de reparcelar os débitos incluídos no PAEX (Medida Provisória n° 303/2006)

6. Inconstitucionalidade e ilegalidade do art. 31: impossibilidade de se arrolar administrativamente os bens do cônjuge e dos sócios do sujeito passivo

Medida Provisória n° 449/2008: vedação à compensação de IRPJ e CSLL estimativa

Entra as modificações introduzidas pela Medida Provisória n° 449/2008, uma em particular poderá causar severos prejuízos às empresas tributadas com base no lucro real que optaram por realizar o pagamento mensal do IRPJ e da CSLL sobre a base de cálculo estimada no exercício de 2008, na forma do que faculta o art. 2° da Lei 9.430/96.

Trata-se do art. 29 da referida Medida Provisória, que incluiu o inciso IX ao § 3° do art. 74 da Lei 9.430/96, e que expressamente veda sejam objeto de compensação "os débitos relativos ao pagamento mensal por estimativa do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL apurados". A partir dessa alteração, todas as empresas tributadas com base na estimativa mensal que, ao final do exercício, apurarem prejuízo, isto é, recolheram IRPJ e CSLL em valor superior ao que deveriam ter recolhido relativamente ao que foi apurado no fechamento final do balanço, não poderão utilizar os valores pagos a maior como crédito para compensar com débitos próprios de IRPJ e CSLL.

Entretanto, sem um exame mais aprofundado, podemos apontar algumas inconstitucionalidades e ilegalidades que permeiam a nova previsão. Inicialmente, há de ser dito que o direito ao crédito tributário, como qualquer outro crédito, se incorpora ao patrimônio de seu titular, sendo, portanto, de sua propriedade. Ora, se o crédito tributário de titularidade do sujeito passivo compõe o seu patrimônio, ou melhor, é de sua prorpriedade, trata-se, por isso, de verdadeiro direito fundamental, protegido pelo art. 5°, caput e inciso XII, da Constituição Federal, cujo exercício não pode ser restringido por legislação infraconstitucional. Ademais, a prática comumentemente adotada pelo Poder Público de ser devedor de determinado sujeito passivo e exigir o pagamento de seus créditos em dinheiro deste mesmo sujeito passivo, vedando a compensação, passa muito além do Princípio da Moralidade Administrativa, que é de observância obrigatória, conforme art. 37 da Constituição Federal. Além disso, inexiste qualquer justificativa plausível para vedação à compensação estabelecida, estando a nova previsão desprovida de qualquer razoabilidade.

Na mesma linha, a impossibilidade de realizar a compensação faz com que o Imposto de Renda passe a gravar a receita, situação que não se coaduna com a regra constitucional que autoriza a incidência desse imposto sobre a "renda", entendida como o acréscimo patrimonial verificado em determinado período. Da mesma forma, a alíquota efetivamente praticada, tendo-se em vista a impossibilidade de compensação, passa a ser muito maior que a legalmente prevista. O direito de compensção ainda é da própria técnica de apuração do IRPJ e da CSLL. A nova regra, por isso, mais assemelha-se a confisco.

Não fosse isso suficiente, a aplicação imediata da nova legislação viola os princípios da segurança jurídica e da não-surpresa do contribuinte, uma vez que este já estava preparado para realizar a compensação como sempre fez, sendo, portanto, inconstitucional a "modificação da regra no meio do jogo". Também há violação aos princípios da anterioridade e da anterioridade nonagesimal. Na forma da jurisprudência do STF (ADIn-MC 2325), "toda modificação legislativa que, de maneira direta ou indireta, implicar carga tributária maior há de ter eficácia no ano subseqüente àquele no qual veio a ser feita", sendo que a vedação ao aproveitamento de crédito legitimamente auferido caracteriza efetivo aumento da carga tributária. Por isso, o dispositivo em questão deve respeitar os princípios constitucionais da anterioridade e da anterioridade nonagesimal.

A toda evidência, o art. 74, § 3°, inciso IX, da Lei 9.430/96, incluído pela MP 449/2008, pode e deve ser questionado perante o Poder Judiciário.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Medida Provisória n° 449/2008: refiscalização eterna?

Outro dispositivo da Medida Provisória n° 449/2008 que parece não ter ainda chamado a atenção é o art. 53, que possui a seguinte redação:

Art. 53. Em relação aos tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, é possível mais de um procedimento de fiscalização sobre o mesmo período de apuração de um mesmo tributo, mediante ordem emitida por autoridade administrativa competente, nos termos definidos pelo Poder Executivo.

Tal artigo, por incrível que pareça, possibilita ao Fisco fiscalizar "eternamente" determinado contribuinte. Perceba-se que por sua redação atual, estará a Receita Federal autorizada a exercer reiteradas fiscalizações sobre o mesmo (i) período de apuração, (ii) tributo e (iii) contribuinte. Essa nova previsão legitima a nefasta e arbitrária prática da refiscalização, que viola os princípios da confiança na administração e da imutabilidade do lançamento.

A regra da imutabilidade do lançamento é aquela que determina que o lançamento somente poderá ser revisado de ofício nos casos em que a lei expressamente assim autorizar. Aliás, esse é o posicionamento da doutrina mais abalizada:

"O art. 146/CTN determina que os critérios jurídicos adotados pela autoridade no lançamento não poderão ser modificados. Já o art. 149/CTN estipula os casos em que o lançamento será revisto de ofício e somente nesses é que poderá um mesmo fato ser refiscalizado. A fiscalização, nos demais casos, não poderá ser alterada sob pena de violar o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Ressalta que a imutabilidade do ato contém dupla proteção. Uma, ao contribuinte que tem a garantia de não ser perseguido pelo fisco, e, duas, ao funcionário que terá a validade de seu trabalho respeitada." (PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência, 3. ed., rev. atual., Porto Alegre: Livraria do Advogado: ESMAFE, 2001, p. 712)

Todo o procedimento de fiscalização realizado pelos Auditores da Receita Federal do Brasil, quando constatada ausência ou insuficiência no recolhimento de determinado tributo, tem como conseqüência, invariavelmente, a lavratura de Auto de Infração, que formaliza o lançamento dos valores impagos ou pagos a menor. Ora, uma vez realizada a fiscalização e efetuado o lançamento, o Auditor encerra a sua atividade, não podendo voltar atrás para lançar parcelas não lançadas, salvo os casos expressamente previstos no arts. 146 e 149 do Código Tributário Nacional, recepcionado pela Constituição Federal de 1988 como Lei Complementar. A conclusão do procedimento de fiscalização caracteriza ato jurídico perfeito que não pode ser modificado ao sabor de ato administrativo, sob pena de inconstitucionalidade.

A nova previsão do art. 53, a par de sua ilegalidade, por contrariar o disposto nos arts. 146 e 149 do CTN, premia o Auditor que não exerce sua atividade de forma satisfatória, seja por desídia ou por falta de qualificação para tanto. Ressalte-se que, hoje em dia, tais auditores são exceção, na medida em que o corpo de fiscais da Receita está muito bem qualificado, tanto em termos técnicos, como em relação à qualidade do seu trabalho. Não fosse assim, a Secretaria da Receita Federal do Brasil não estaria batendo recordes de arrecadação mensalmente.

No entanto, é importante referir que em uma primeira fiscalização os Auditores têm amplo acesso a todos os documentos e livros fiscais da empresa fiscalizada, relativamente à matéria e ao período fiscalizado. Permitir possa um mesmo contribuinte sofrer diversas fiscalizações idênticas, sem justificativa aparente, que não a do trabalho realizado de forma insatisfatória, viola o princípio da confiança na Administração Pública, na medida em que deve o contribuinte ter sempre a garantia de que não vai ser perseguido pelo Fisco, o que está sendo desrespeitado pelo dispositivo em comento.

Por essa razão, a prática inconstitucional e ilegal da refiscalização deve ser extirparda da MP 449/2008, quando da sua conversão em lei.

Lei Complementar n° 128/2008: possibilidade de tomada de crédito de ICMS no Simples Nacional

Na data de 19/12/2008, foi publicada a Lei Complementar n° 128, que patrocina uma série de modificações na Lei Complementar n° 123/2006, que dispõe sobre o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte (Supersimples). Diversas foram as modificações, mas a que mais se faz sentir e a mais esperada é a possibilidade de tomada de créditos de ICMS por parte de empresas não optantes pelo Simples Nacional que adquirem mercadorias das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte.

Há muito tempo já vínhamos defendendo a inconstitucionalidade de tal vedação, conforme a postagem intitulada Projeto de Lei Complementar autoriza Microempresas e Empresas de Pequeno Porte a transferirem créditos. Na época, afirmamos o seguinte:

Entretanto, é importante referir que essa vedação não se sustenta juridicamente. Primeiro, porque a não-cumulatividade do ICMS, que pressupõe a transferência de créditos, é uma garantia constitucional que não pode ser amesquinhada por legislação infraconstitucional, conforme art. 155, § 2º, inciso I, da Constituição Federal. Segundo, porque a vedação ao creditamento importaria excluir as microempresas e as empresas de pequeno porte da cadeia negocial, uma vez que nenhum estabelecimento comercial irá ter por fornecedor uma empresa que não lhe permita a tomada de crédito nas mercadorias adquiridas. Tal situação acabaria por elevar o preço final das mercadorias que comercializa, diminuindo o seu valor competitivo. Terceiro, porque a vedação ao crédito faz com que o ICMS incida sobre o faturamento e não sobre a operação de circulação de mercadorias.

Pois a Lei Complementar n° 128 acabou com tal celeuma ao incluir o parágrafo primeiro ao art. 23 da Lei Complementar n° 123/2006, que tem a seguinte redação:

§ 1° As pessoas jurídica e aquelas a elas equiparadas pela legislação tributária não optantes pelo Simples Nacional terão direito a crédito correspondente ao ICMS incidente sobre as suas aquisições de mercadorias de microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional, desde que destinadas à comercialização ou industrialização e observado, como limite, o ICMS efetivamente devido pelas optantes pelo Simples Nacional em relação a essas aquisições.

Trata-se de medida louvável do Legislador Nacional, que agora acaba com quaisquer dúvidas a respeito da possibilidade do creditamento. Claro que ainda devemos aguardar para ver como será implementada a modificação, inclusive com as próprias restrições ao aproveitamento fixadas pela Lei Complementar n° 128.

Por fim, é importante referir que as empresas não optantes que adquiriram mercadorias de microempresas e empresas de pequeno porte antes do advento da Lei Complementar n° 128 fazem jus ao respectivo crédito, tendo-se em vista a inconstitucionalidade na vedação à tomada do crédito, situação que pode ensejar ação judicial.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Medida Provisória n° 449/2008: redução das multas moratórias aplicadas pelo INSS em face da "retroatividade benigna"

O art. 35 da Lei 8.212/91, com a redação que lhe foi atribuída pela 9.876/99, regulava a aplicação da multa moratória então aplicada pelo INSS nos lançamentos das contribuições previdenciárias impagas ou pagas com atraso em percentuais que variavam de 4% a 100% sobre o valor do débito.

A Medida Provisória n° 449/2008 alterou a redação do artigo 35 da Lei 8.212/91, para atribuir-lhe a seguinte redação:

Art. 35. Os débitos com a União decorrentes das contribuições sociais previstas nas alíneas "a", "b" e "c" do parágrafo único do art. 11, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos, não pagos nos prazos previstos em legislação, serão acrescidos de multa de mora e juros de mora, nos termos do art. 61 da Lei n° 9.430, de 1996.

Ocorre que o art. 61 da Lei n° 9.430/96, por meio de seu parágrafo segundo, informa que a multa moratória a ser aplicada não pode ser superior a 20% sobre o valor do débito. Note-se, portanto, que a alteração patrocinada pela Medida Provisória n° 449/2008 reduziu significativamente algumas das multas aplicadas pelo INSS, isto é, todas aquelas que foram aplicadas em valores superiores a 20%.

Dessa maneira, se a lei nova (MP 449/2008) estabeleceu redução de penalidade, deve ela ser aplicada retroativamente aos casos ainda não definitivamente julgados, o que compreende os valores lançados e objeto de processo administrativo, os valores inscritos em dívidas e até mesmo os valores já em fase de execução fiscal, ao teor do que prescreve o art. 106, II, alínea "c", do Códito Tributário Nacional, abaixo reproduzido:

Art. 106. A lei aplica-se a ato ou fato pretérito:
(...)
II - tratando-se de ato não definitivamente julgado:
(...)
c) quando lhe comine penalidade menos severa que a prevista na lei vinte ao tempo da sua prática.

Portanto, se a Medida Provisória n° 449/2008, através da alteração da redação do art. 35 da Lei n° 8.212/91, aplica penalidade menos severa, deve ela ser aplicada retroativamente a todos os casos ainda não definitivamente julgados (excluídos apenas os casos com decisão transitada em julgado no Poder Judiciário desfavorável ao contribuinte), em atenção ao princípio da "retroatividade benigna".

Medida Provisória n° 449/2008: Proibição de distirbuição de resultados nas empresas em débito não garantido com a União

O art. 24 da Medida Provisória n° 449/2008 modifica diversos dispositivos da Lei n° 8.212/91, que dispõe sobre a Seguridade Social e seu plano de custeio. A principal finalidade aqui é de adequá-la às recentes modificações que criaram a Secretaria da Receita Federal do Brasil (SuperReceita), instituição que passou a planejar, executar, acompanhar e avaliar as atividades relativas à tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança e recolhimento das contribuições previdenciárias, antes ao encargo do INSS.

Dado interessante é que o art. 52 da Lei 8.212/91, na sua redação original, proibia as empresas em débito com Seguridade Social de distribuir bonificação ou dividendo a acionista e dar ou atribuir cota ou participação nos lucros a sócio cotista, diretor ou outro membro de órgão dirigente, fiscal ou consultivo, ainda que a título de adiantamento. A par de sua questionável constitucionalidade, até se entende tal previsão, na medida em que os valores pagos a título dessas contribuições destinam-se ao financiamento da seguridade social, onde compreendidas a previdência dos empregados e a saúde.

Ocorre que, como já é comum, a Medida Provisória em questão altera diversos dispositivos legais que tratam de diversos assuntos, não apenas de matéria tributária. Uma dessas alterações é a do referido art. 52 da Lei n° 8.212/91, que agora passa a proibir as empresas em débito com a União, não só com a seguridade social, a distribuírem resultados através da aplicação de multas descritas no art. 32 da Lei n° 4.357/64, que não foi recepcionado pela Constituição Federal de 1988, mas que foi ressuscitado pela Lei n° 11.051/2004, que alterou sua redação.

A princípio, parece que a doutrina e os especialistas da área ainda não se aperceberam de tal fato, que futuramente irá causar uma série de transtornos e dores de cabeça para os contribuintes que tenham débitos não garantidos de toda sorte com a União, especialmente porque muitas das vezes tais débitos resultam de divergências em declarações apresentadas e que sequer são de conhecimento do sujeito passivo.

Por isso, apressamo-nos a defender que tal alteração é inconstitucional, especialmente em razão da não-recepção do art. 32 da Lei n° 4.357/64 pela Constituição Federal de 1988, tendo-se em vista a violação ao princípio da livre iniciativa e o fato de representar meio de coação indireta ao pagamento de tributos, expediente vedado pelas Súmulas n° 70, 323 e 547 do STF, como ofensa à legalidade e ao devido processo. Como se sabe, a legislação tributária garante meios e procedimentos próprios para que o Fisco exija seus créditos, sem a necessidade de valer-se de meios que transitam à margem da Constituição Federal e da Lei. Além disso, deve-se ter em mente que a legislação societária estabelece distinções entre a distribuição de dividendos e a atribuição de bonificações ou participações nos lucros, o que também constitui fundamento para a invalidação dessa nova previsão.

Assim, espera-se que o Congresso Nacional, ao apreciar tal Medida Provisória, não mantenha esta alteração, que rememora os não longínquos tempos de exceção e autoritarismo.

Medida Provisória n° 449/2008: e o PAEX?

A Medida Provisória n° 449 foi publicada sob os aplausos daqueles que saudaram a instituição de mais um novo parcelamento, o que poderia equacionar as dívidas de uma série de empresas, do pequeno ao grande devedor.

Entretanto, ao instituir o reparcelamento para devedores que já haviam aderido a parcelamentos anteriores (art. 3°), a Medida Provisória n° 449 não faz qualquer menção aos contribuintes que atualmente têm seus débitos parcelamentos no PAEX (Parcelamento Excepcional), instituído pela Medida Provisória n° 303/2006, limitando-se a falar no REFIS e no PAES. Ocorre que a maioria das empresas que aderiu ao REFIS e PAES teve de desistir desses parcelamentos para aderir ao PAEX, que trazia condições mais vantajosas. Logo, todos os contribuintes que aderiram ao PAEX e que estão reconhecidamente encontrando dificuldades para adimplí-lo, estão impossibilitados de aderir ao novo parcelamento, em razão de um mero "esquecimento" dos autores dessa nova Medida Provisória.

Portanto, espera-se que o Congresso Naciona faça um adendo na MP 449, para permitir que as empresas que aderiram ao PAEX possam reparcelar seus débitos segundo a nova sistemática, permitindo a regularização da situação fiscal e o pagamento de suas obrigações.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Medida Provisória nº 449/2008 e Arrolamento Administrativo de Bens

A Lei n° 9.532/97 inovou o sistema jurídico tributário ao introduzir o instituto do arrolamento administrativo de bens e direitos do sujeito passivo sempre que o valor dos créditos tributários de sua responsabilidade for superior a trinta por cento do seu patrimônio conhecido. Tal instituto permite que a Administração Pública relacione os bens de seus devedores e acompanhe a evolução patrimonial dos mesmos, a fim de resguardar uma futura execução fiscal. Em tese, tal arrolamento não implica imobilização patrimonial, isto é, o sujeito passivo que tem seus bens arrolados não está impedido de aliená-los, onerá-los ou transferi-los, desde que comunique previamente tal situação à Fazenda Nacional, conforme art. 64, § 3º, da Lei 9.532/97. Além disso, ao teor do que prescreve o art. 5º, § 3º, da Instrução Normativa nº 264/2002 da Secretaria da Receita Federal do Brasil, o sujeito passivo é obrigado a arrolar outros bens e direitos em substituição aos alienados ou transferidos.
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O art. 64, § 1º, da Lei nº 9.537/97 possuía a seguinte redação: "Se o crédito tributário for formalizado contra pessoa física, no arrolamento devem ser identificados, inclusive, os bens e direitos em nome do cônjuge, não gravados com a cláusula de incomunicabilidade". Como se vê, tal dispositivo autorizava a autoridade administrativa a arrolar os bens do cônjuge da pessoa física autuada, desde que tais bens fossem comunicáveis, isto é, não fossem de propriedade exclusiva do cônjuge. Logo, o arrolamento poderia incidir sobre a quota-parte do cônjuge, mas somente nos bens que fossem do propriedade comum.
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.O art. 31 da Medida Provisória nº 449/2008 alterou o parágrafo 1º do art. 64 da Lei nº 9.532/97, para atribuir-lhe a seguinte redação:
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.§ 1º No arrolamento, devem ser identificados também os bens e direitos:
I - em nome do cônjuge, desde que não comunicáveis na forma da lei, se o crédito tributário for formalizado contra pessoa física; ou
II - em nome dos responsáveis tributários de que trata o art. 135 da Lei nº 5172, de 25 de outubro de 1966 - Códito Tributário Nacional.
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A nova redação do parágrafo 1º da Lei 9.532/97 está, indubitavelmente, maculada, tendo-se em vista ser inconstitucional e ilegal. Note-se que 0 arrolamento dos bens particulares do cônjuge (incomunicáveis, portanto) do sujeito passivo autuado ou que possui dívidas tributárias esbarra na previsão do art. 5º, inciso XLV, que prevê que "nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido". Em realidade, salvo expressa anuência ou nos casos expressos em lei, ninguém responde por dívidas de terceiro. O Código Tributário Nacional, por meio de seu art. 133, inciso II, é claro ao determinar que o cônjuge responde pelos débitos de seu parceiro apenas com sua meação ou, em caso de falecimento, na hipótese de ser sucessor, pelos tributos devidos até a data do óbito, limitados ao montante do quinhão ou legado. As normas civis e de processo civil apenas em casos excepcionais admitem que os bens do cônjuge respondam pelas dívidas de seu companheiro, como na hipótese de obrigações contraídas em benefício da família, o que não ocorre no caso de dívidas tributárias. A nova redação do dispositivo em comento patrocina a esdrúxula situação de indisponibilizar-se os bens de uma pessoa em razão de dívida de terceiro, bens estes que sequer poderão servir de garantia para uma possível execução fiscal.
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Por outro lado, o inciso II também não merecer ser confrimado por nosso parlamento quando da conversão em lei. É que a responsabilização das pessoas previstas no art. 135 do Código Tributário Nacional, especialmente os sócios, gerentes e diretores das pessoas jurídicas, depende da efetiva comprovação de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos, o que depende de prévia apuração em regular processo administrativo, onde deverá ser apontada exatamente a conduta que conduza à responsabilização pessoal. Não está autorizada a Fazenda a, desde logo, arrolar os bens das pessoas a que alude o art. 135 do CTN.
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Como se vê, trata-se de uma questão sensível, que merecerá maior atenção de nosso legislador quando da conversão em lei.

Media Provisória nº 449, de 3 de dezembro de 2008: análise de alguns pontos críticos

No último dia 4 de dezembro de 2008, foi publicada no Diário Oficial da União a Medida Provisória nº 449/2008, que patrocinou diversas modificações à legislação tributária federal. Muita se falou e se tem falado acerca dos benefícios trazidos pela nova Medida Provisória. Entretanto, a nova legislação tem alguns pontos sensíveis, que pretendemos analisar a partir de hoje nesse blog.

sábado, 1 de novembro de 2008

Liminar Deferida: arrolamento administrativo de bens está limitado ao valor do crédito tributário exigido

A Lei n° 9.532/97 inovou o sistema jurídico tributário ao introduzir o instituto do arrolamento administrativo de bens e direitos do sujeito passivo sempre que o valor dos créditos tributários de sua responsabilidade for superior a trinta por cento do seu patrimônio conhecido.
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Tal instituto permite que a Administração Pública relacione os bens de seus devedores e acompanhe a evolução patrimonial dos mesmos, a fim de resguardar uma futura execução fiscal. Em tese, tal arrolamento não implica imobilização patrimonial, isto é, o sujeito passivo que tem seus bens arrolados não está impedido de aliená-los, onerá-los ou transferi-los, desde que comunique previamente tal situação à Fazenda Nacional, conforme art. 64, § 3º, da Lei 9.532/97. Além disso, ao teor do que prescreve o art. 5º, § 3º, da Instrução Normativa nº 264/2002 da Secretaria da Receita Federal do Brasil, o sujeito passivo é obrigado a arrolar outros bens e direitos em substituição aos alienados ou transferidos. Esta última previsão não consta da lei, o que por si só já viola o princípio da legalidade, pois uma Instrução Normativa não não pode estabelecer obrigações, prerrogativa única do Poder Legislativo.
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Ocorre que muitas das vezes a fiscalização da Receita Federal do Brasil tem arrolado a totalidade do patrimônio dos contribuintes, inclusive em montante superior ao crédito tributário exigido. A primeira conseqüência é a efetiva imobiliação patrimonial, uma vez que, se tem o sujeito passivo todo o seu patrimônio arrolado, não possui outros bens para oferecer em substituição em relação àqueles que serão alienados ou transferidos. Logo, qualquer tentativa de movimentação patrimonial está impedida, o que autoriza a utilização de medidas judiciais pretendendo o desembaraço dos bens. Na mesma linha, não está a Administração livre para arrolar os bens e valores que bem entender, pois está jungida aos limites legais e infralegais previamente estabelecidos.
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Nesse sentido, estabelece o art. 64-A da Lei 9.532/97 que o arrolamento deve estar limitado ao montante do crédito tributário exigido do sujeito passivo, somente podendo alcançar outros bens e direitos para fins de complementar tal valor. Essa é a letra da lei:
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Art. 64-A. O arrolamento de que trata o art. 64 recairá sobre bens e direitos suscetíveis de registro público, com prioridade aos imóveis, e em valor suficiente para cobrir o montante do crédito tributário de responsabilidade do sujeito passivo.
Parágrafo único. O arrolamento somente poderá alcançar outros bens e direitos para fins de complementar o valor referido no caput.
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Como se isso não fosse suficiente, a própria Receita Federal do Brasil, ao disciplinar o procedimento de arrolamento por meio da já citada Instrução Normativa n° 264/2002l, norma infralegal de observância obrigatória pela Administração, é clara ao disciplinar que o arrolamento só incide sobre bens suficientes para cobrir o montante do crédito tributário, nos exatos termos do seu art. 7°, § 2°:
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Art. 7º (...)
§ 2° O arrolamento recairá sobre bens e direitos suscetíveis de registro, com prioridade para os imóveis, e em valor suficiente para cobrir o montante do crédito tributário, somente alcançando outros bens e direitos para fins de complementar o montante do referido crédito.
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A conclusão, portanto, é a de que o arrolamento para acompanhamento do patrimônio do sujeito passivo não pode ultrapassar o montante do crédito tributário exigido, sob pena de ilegalidade.
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Recentemente, o juízo da 3ª Vara Federal de Brasília deferiu liminar em ação judicial determinando que o arrolamento deve estar adstrito ao valor do crédito tributário exigido, determinando o cancelamento do arrolamento dos bens que superem tal valor.
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Trata-se de um precedente interessante, que se espera seja seguido pelos demais membros do Poder Judiciário, pois não pode o contribuinte sujeitar-se à arbitrariedade daqueles que se utilizam de via transversa para cobrar tributos.

sábado, 18 de outubro de 2008

Advogado Andrei Cassiano concede entrevista ao periódico Valor Econômico

No último dia 15/10/2008, o periódico Valor Econômico publicou a matéria intitulada Receita reduz PIS/Cofins de Transportadoras, que contou com a participação do Dr. Andrei Cassiano.
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O Advogado esclareceu acerca dos efeitos da revogação do Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 23 pelo Ato Declaratório Interpretativo n° 27 e a manutenção dos transportadores coletivos de passageiros no sistema cumulativo do PIS e da COFINS.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Receita reconhece: todas as receitas dos transportadores coletivos de passageiros sujeitam-se ao regime cumulativo do PIS/COFINS

Muito debatemos acerca da inconstitucionalidade e da ilegalidade do Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 23, que sujeitava as receitas decorrentes da prestação de serviços rodoviários de passageiros sob os regimes de fretamento ou turístico à tributação não-cumulativa do PIS e da COFINS. Inclusive, tivemos a oportunidade de ver tais ilegalidades e inconstitucionalidades reconhecidas por sentença de mérito.
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Defendíamos que o art. 10, inciso XII, da Lei 10.833/03 não faz qualquer diferença entre o transporte coletivo público de passageiros e o transporte coletivo de passageiros prestado em regime de fretamento ou turístico. Por este motivo, um ato de inferior hierarquia, como o Ato Declaratório Interpretativo RFB n° 23, não poderia assim o fazer.
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Pois em decisão inédita, publicada na data de hoje, 08/10/2008, a Secretaria da Receita Federal do Brasil reconsiderou a sua posição, atenta, certamente, ao que os especilistas na área vinham comentando. Por meio do Ato Declaratório Interpretativo n° 27, a Receita Federal revogou o ato anterior e determina explicitamente que "as receitas decorrentes da prestação de serviços de transporte coletivo rodoviário, metroviário, ferroviário e aquaviário de passageiros, inclusive na modalidade de fretamento ou para fins turísticos, submetem-se ao regime de apuração cumulativa da contribuição para o PIS/Pasep e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins)".
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Trata-se de uma importante vitória das empresas que atuam no ramo, que estavam submetidas a ilegal e inconstitucional aumento de carga tributária. Espera-se, agora, que a Receita Federal do Brasil adote o mesmo procedimento em diversos outros casos de escancarada ilegalidade e inconstitucionalidade, evitando o tortuoso caminho judicial.

terça-feira, 9 de setembro de 2008

Sentença proferida: empresas de transporte coletivo de passageiros devem permanecer no regime cumulativo do PIS/COFINS

Há algum tempo temos defendido a ielgalidade e a inconstitucionalidade do Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 23, que determina que as receitas auferidas por empresas que prestem o serviço de transporte coletivo de passageiros por fretamento ou turístico estão sujeitas à tributação não-cumulativa do PIS/COFINS, diferentemente do que ocorre com as empresas que prestam o serviço de transporte coletivo público de passageiros.
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Além de violar o princípio da legalidade, tal ato declaratório interpretativo patrocina elevação da carga tributária, com graves impactos financeiros para as empresas do setor. O tema foi pela primeira vez abordado neste blog na data de 05/06/2008, através da postagem "Transporte Coletivo de Passageiros: inconstitucionalidade e ilegalidade da tributação não-cumulativa pelo PIS/COFINS", tendo sido também objeto de matéria publicada no periódico Valor Econômico com o seguinte título: Sistema não-cumulativo é alvo de mais uma disputa.
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Pois no último dia 08/09/2008, a Justiça Federal de Santa Cruz do Sul/RS proferiu a primeira sentença que se tem notícia em âmbito nacional reconhecendo a ilegalidade do Ato Declaratório Interpretativo RFB n° 23 e determinando a manutenção de todas as receitas de empresa de transporte coletivo de passageiros sob o regime cumulativo, independentemente do regime em que for prestado o serviço.
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Trata-se de uma importante vitória para as empresas do setor, sendo aconselhável àquelas que ainda não propuseram a ação judicial que o façam o mais rápido possível, a fim de evitar a elevação da carga tributária ou uma possível autuação fiscal.
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Para consultar a sentença, clique aqui.

sábado, 6 de setembro de 2008

Simples Nacional: inconstitucionalidade da exclusão das microempresas e empresas de pequeno porte em débito

Noticia-se que a Receita Federal do Brasil iniciou os procedimentos para exclusão do Simples Nacional das microempresas e das empresas de pequeno porte que estejam em débito. Estima-se que mais de 400 mil empresas serão sumariamente excluídas, caso não parcelem ou quitem integralmente as suas pendências.
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Entretanto, é importante destacar que a expropriação do patrimônio privado tendo em vista a cobrança de tributo deve seguir um procedimento rigidamente delineado, que é decorrência lógica dos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, da legalidade e do livre exercício das atividades. Tal procedimento pressupõe uma fase administrativa, que, depois de esgotada, é precedida pela execução fiscal, único meio legítimo para a Fazenda Pública exigir os seus créditos. Além disso, o Supremo Tribunal Federal, por meio das Súmulas 70, 323 e 547, há muito tempo já decidiu que qualquer atitude tendente a coagir o contribuinte ao pagamento de tributo, como vedar a emissão de notas fiscais, inscrever em cadastros de inadimplentes, interditar o estabelecimento comercial e/ou apreender mercadorias, é inconstitucional. Logo, qualquer atitude que caracterize via transversa de cobrança é ilegítima por desbordar do figurino constitucional.
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Ora, a ameaça de exclusão do Simples Nacional das empresas inadimplentes nada mais é que um meio de compelir o contribuinte ao pagamento dos débitos que possui frente ao Fisco Federal, situação considerada inconstitucional pelo STF.
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Por isso, toda a microempresa ou empresa de pequeno porte que for notificada pela Receita Federal do Brasil de uma possível exclusão do Simples Nacional em razão dos débitos que possui, poderá se valer de ação judicial objetivando a sua manutenção nesse regime.

sábado, 23 de agosto de 2008

Súmula Vinculante nº 8 do STF: aplicabilidade imediata

No último dia 20/06/2008 foi publicada a Súmula Vinculante nº 8 do STF, que declara inconstitucionais os arts. 45 e 46 da Lei 8.212/91, que estenderam para 10 (dez) anos os prazos para lançamento e cobrança judicial das contribuições previdenciárias. De fato, esta é a redação da referida Súmula Vinculante: "São inconstitucionais o parágrafo único do art. 5º do Decreto-lei nº 1.569/1977 e os artigos 45 e 46 da Lei nº 8.212/1991, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário".
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Muito já se comentou e se tem a comentar sobre o importante avanço que foi a edição desta Súmula. Entretanto, temos visto algumas opiniões que, salvo melhor juízo, equivocam-se relativamente aos efeitos produzidos pela Súmula e a obrigatoriedade de seu cumprimento pelo Judiciário e pela Administração Pública. Tem se afirmado que somente a emissão de Resolução por parte do Senado Federal suspendendo os efeitos dos arts. 45 e 46 da Lei nº 8.212/91, na forma do que prevê o art. 52, inciso X, da Constituição Federal, obrigaria a Administração a seguir a nova orientação ditada pelo Supremo Tribunal Federal.
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Todavia, a necessidade de expedição de Resolução do Senado Federal suspendendo a execução de lei declarada inconstitucional aplica-se apenas aos casos de controle difuso de constitucionalidade. Nessa hipótese, a declaração de inconstitucionalidade pelo STF tem efeito inter partes, o que quer dizer, vincula apenas as partes litigantes em determinando processo judicial, não obrigando que os demais órgãos do Poder Judiciário, da Administração Pública e até mesmo os particulares procedam de acordo com essa decisão.
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Por outro lado, os efeitos produzidos pela Súmula Vinculante assemelham-se àqueles decorrentes do controle concentrado de constitucionalidade, situação que se depreende da simples leitura do art. 103-A da Constituição Federal, que assim prevê:
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"Art. 103-A. O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei."
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Veja-se que a redação do dispositivo constitucional acima transcrito não deixa dúvidas: a contar de sua publicação, a Súmula Vinculante produzirá efeitos que vincularão os demais órgãos do Poder Judiciário e da administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Nesse sentido, dúvida não há quanto ao fato de que tanto o Poder Judiciário, como a Administração Pública estão obrigados a observar o teor da Súmula Vinculante e a decidir ou a proceder identicamente ao que ela prescreve. O próprio art. 4º da Lei 11.417/2006, que regulamenta a o art. 103-A, é claro ao atestar a aplicação imediata aqui defendida:
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"Art. 4o A súmula com efeito vinculante tem eficácia imediata, mas o Supremo Tribunal Federal, por decisão de 2/3 (dois terços) dos seus membros, poderá restringir os efeitos vinculantes ou decidir que só tenha eficácia a partir de outro momento, tendo em vista razões de segurança jurídica ou de excepcional interesse público."
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Logo, desde o dia 20/06/2008, estão o Poder Judiciário e os órgãos da Administração Pública Federal obrigados a seguir a Súmula Vinculante nº 8 do STF. Os próprios fiscais da Receita Federal do Brasil estão impedidos de lançar contribuições previdenciárias em período superior aos 5 anos anteriores do início da fiscalização.
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Tanto é verdade que as próprias Delegacias de Julgamento da RFB e os Conselhos de Contribuintes do Ministério da Fazenda já estão aplicando a Súmula Vinculante nº 8, do que é exemplo a decisão abaixo transcrita:
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"CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLLEXERCÍCIO: 1996, 1997Ementa: OMISSÃO DE RECEITAS - INTEGRALIZAÇÃO DE CAPITAL - A falta de comprovação da origem e da efetiva entrega à empresa dos recursos destinados à integralização de capital autoriza a presunção de que eles sejam originários de receita omitida.DECADÊNCIA - CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS - Declarada a inconstitucionalidade do art. 45 da Lei nº 8.212, de 1991, pelo Supremo Tribunal Federal (súmula vinculante nº 8 – DOU de 20 de junho de 2008), cancela-se o lançamento que não observou o prazo qüinqüenal previsto no Código Tributário Nacional." (Recurso n 161480, Processo nº 10235.001285/2005-19, Acórdão nº Acórdão 105-17085, Segundo Conselhos de Contribuintes, Quinta Câmara, julgado em 25/06/2008)
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Importante frisar que o ato que contrariar ou equivocadamente aplicar a Súmula Vinculante nº 8 poderá ensejar a distribuição de Reclamação ao STF (art. 103-A, parágrafo 3º, da Constituição Federal), sem prejuízo da responsabilização pessoal do agente público que efetivamente praticou tal ato.

sábado, 16 de agosto de 2008

E o Imposto de Renda Chinês?

As Olimpíadas iniciaram-se e a atenção de todo o mundo está voltada para o seu país sede, a China. País de uma tradição milenar, responsável por grandes invenções da humanidade, como a bússola, o papel e a pólvora, além de possuir uma cultura magnífica.
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Já há algum tempo a China vem chamando a atenção em razão de seu acelerado e supreendente crescimento econômico, denominado historicamente de "milagre econômico chinês". Após 21 anos de um regime totalitário, em que o país foi conduzido à mão-de-ferro pelo ditador Mao Tse Tung, em 1976, Deng Xiaoping assume o governo com o objetivo de recuperar tecnologica e economicamente a China. Este regime ficou conhecido como socialismo de livre mercado, onde o país abriu-se para o capital e investimento externo, mantendo, entretanto, o regime político, que vige até os dias atuais.
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Efetivamente, a China tem se caracterizado como ponto estratégico para diversas empresas que lá têm se estabelecido, objetivando produzir e exportar a baixos custos, decorrentes da farta, barata e disciplinada mão-de-obra (1,3 bilhão de habitantes), da quase inexistência de direitos trabalhistas e uma menor preocupação com as questões ambientais.
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Muito se comenta acerca da China e dessas facilidades para todos aqueles que lá pretendem investir. Contudo, pouco se fala sobre o sistema tributário chinês, como se ele sequer existisse. Ocorre que de fato ele existe e recentemente sofreu uma importante alteração, que sucintamente passamos a expor.
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Em janeiro de 2008 passou a viger na China a nova legislação do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas, que trouxe interessantes inovações, às quais devem estar atentos todos aqueles que pretendam estender seus negócios para o oriente. Foram duas as principais alterações: primeiro, todas as empresas serão tributadas à mesma alíquota, independentemente da nacioalidade de seus proprietários, sócios ou diretores, que é a de 25%; segundo, o direito de regiões específicas oferecerem benefícios fiscais foi regovado. A partir de janeiro deste ano, todos os incentivos fiscais a serem concedidos passarão a promover determinados ramos de atividade ou indústria, ao invés de determinadas regiões do território chinês. Essa nova legislação prevê a redução da alíquota para certas indústrias, incluindo aquelas que têm suas atividades ligadas à proteção do meio-ambiente e à conservação da energia, à infraestrutura pública, à agricultura e a novas e altas tecnologias. Entretanto, o grande problema que a doutrina especializada vem apontando é que a implementação destes benefícios depende de regulação por meio de legislação complementar, tal qual os Decretos e Instruções Normativas brasileiros, por exemplo. Ocorre que grande parte desta legislação complementar ainda não foi elaborada e o governo chinês não definiu um prazo para que isto ocorra, o que vem gerando grande frustação para os investidores chineses e estrangeiros.
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Não pretendemos com este pequeno comentário esgotar o tema, apenas trazer uma questão atual e interessante que vem acometendo aqueles que têm planos de investir na China.
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Para informações mais detalhadas recomendamos a leitura do China Law Blog, blog especializado no direito chinês.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Advogado Andrei Cassiano concede entrevista ao periódico Valor Econômico

Na data de hoje, 11/08/2008, o periódico Valor Econômico publicou a matéria intitulada Sistema não-cumulativo é alvo de mais uma disputa, que contou com a participação do Dr. Andrei Cassiano.
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O Advogado esclareceu acerca da ilegalidade e da inconstitucionalidade da incidência não-cumulativa do PIS e da COFINS sobre as empresas que prestem os serviços de transporte coletivo de passageiros por fretamento ou turístico. O tema foi pela primeira vez abordado neste blog na data de 05/06/2008, através da postagem "Transporte Coletivo de Passageiros: inconstitucionalidade e ilegalidade da tributação não-cumulativa pelo PIS/COFINS".


sábado, 12 de julho de 2008

Inconstitucionalidade/ilegalidade do ICMS incidente nas contas de energia elétrica sobre a demanda reservada de potência

O ICMS incidente sobre a energia elétrica vem sendo cobrado tendo por base o valor total da fatura (conta de luz), incluída a demanda reservada de potência, que é a tensão posta permanentemente à disposição do consumidor, paga independentemente de sua utilização.
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Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça, em diversas decisões (v.g. REsp 222.810 e REsp 343.952), afirmou que o ICMS deve incidir sobre o valor da energia elétrica efetivamente consumida, isto é, a que for entregue ao consumidor e, portanto, tenha saído da linha de transmissão e entrado no estabelecimento da empresa.
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O ICMS só incide sobre a energia efetivamente utilizada, tomando-se por base de cálculo o valor pago em decorrência do consumo apurado. Assim, se o consumo de energia foi menor que o contratado como demanda, o contribuinte não deverá recolher o ICMS sobre o valor excedente.
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Diante disso, possível é a propositura de ação judicial a fim de reconhecer o direito da empresa de não recolher o ICMS sobre o total de energia elétrica proveniente de contrato de reserva de demanda, combinado com pedido de compensação dos valores indevidamente recolhidos.

terça-feira, 17 de junho de 2008

Clínicas Médicas – Redução do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido

A Clínica Médica que esteja submetida à tributação com base no “lucro presumido” e preste serviços hospitalares, estabelecidos na Instrução Normativa n.º 306 da Secretaria da Receita Federal, revogada pela Instrução Normativa n.º 480 e posteriormente alterada pela Instrução Normativa n.º 539, deve aplicar o percentual de 12% e não mais de 32% sobre a receita bruta para apuração da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) e o percentual de 8% e não mais de 32% sobre a receita bruta para a apuração da base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ). Assim vem reiteradamente decidindo a Superior Tribunal de Justiça, entendimento exemplificado na seguinte decisão:
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TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO DE INFERTILIDADE CONJUGAL. SERVIÇOS HOSPITALARES. APLICAÇÃO DOS ARTS. 15, § 1º, III, "A", E 20 DA LEI N. 9.249/95. IRPJ E CSLL. REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO.1. São considerados hospitalares os serviços de diagnóstico e tratamento da infertilidade conjugal que incluem a realização de serviços de imagenologia e de procedimentos cirúrgicos.2. Incidência dos arts. 15, § 1º, III, "a", e 20 da Lei n. 9.249/95, segundo os quais a base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido devida pelas pessoas jurídicas prestadoras de serviços hospitalares será de 8% e 12% da receita bruta, respectivamente.3. Recurso especial não-provido. (REsp n.º 778.406/RS, STJ, Segunda Turma, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, julgado em 11/04/2006, publicado no DJ de 29/05/2006, p. 215)
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Portanto, as Clínicas Médicas que obtiverem decisões judiciais favoráveis perceberão ganho financeiro considerável, diminuindo sobremaneira sua carga tributária. Além disso, os valores pagos a maior em exercícios anteriores poderão ser restituídos ou compensados com os futuros encargos tributários.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

E o STF finalmente decidiu: prazo para lançamento e execução de contribuições previdenciárias é de 5 anos

Ontem (11/06/2008), após anos de batalha, finalmente uma das inconstitucionalidades que há mais tempo se perpetua no sistema jurídico nacional foi banida. É que o Supremo Tribunal Federal, apreciando os Recursos Extraordinários nº 556664, 559882, 559943 e 560626, decidiu pela inconstitucionalidade dos artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que alargaram para 10 anos o prazo para que a Administração Pública lance e execute as contribuições previdenciárias. Tal decisão ainda motivou a edição da Súmula Vinculante nº 8, que assim prescreve: “São inconstitucionais os parágrafo único do artigo 5º do Decreto-lei 1569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário”. A edição desta Súmula obriga a que todas as instâncias do Poder Judiciário decidam de acordo com a posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal.
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O Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, os Tribunais Regionais Federais e o próprio Superior Tribunal de Justiça, por meio de sua Corte Especial, ao apreciar o Incidente de Inconstitucionalidade suscitado no Recurso Especial nº 616348/MG, já vinham majoritariamente decidindo pela inaplicabilidade dos prazos decenais previstos na Lei 8.212/91.
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E o motivo para a decisão do STF é bem simples: o art. 146, inciso III, alíena b, da Constituição Federal determina que cabe exclusivamente à Lei Complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre prescrição e decadência. Ora, a Lei n.º 8.212/91 é lei ordinária, não tendo se submetido ao rigores afeitos à legislação complementar para sua aprovação, especialmente no que respeita ao quórum qualificado. Nesse sentido, jamais poderia dispor a respeito da prescrição e da decadência tributárias, sendo inconstitucional desde a sua concepção.
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Ponto interessante da decisão e inédita na Corte Constitucional foi a modulação de seus efeitos, que representa uma ressalva à declaração de inconstitucionalidade e atenta para a repercussão econômica da questão (cerca de R$ 96 bilhões entre valores já arrecadados ou em vias de cobrança pela União). Por meio desta modulação, entendeu o STF como legítimos os recolhimentos efetuados nos prazos previstos nos artigos 45 e 46 e não impugnados antes da conclusão deste julgamento. Portanto, somente os contribuintes que ajuizaram ações até 11/06/2008 poderão obter a restituição dos tributos pagos indevidamente. Aqueles que assim não o fizeram, não terão direito de reaver o que pagaram. Se o tributo ainda não foi pago, será declarada a sua inexigibilidade.

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Não só o empresário sofre nas mãos do INSS

A contribuição previdenciária incidente sobre a folha de salários que vem sendo muito discutida ultimamente, especialmente porque teimam o INSS e a Secretaria da Receita Federal do Brasil em exigí-la sobre parcelas que não têm caráter remuneratório, faz outras vítimas além do empresariado nacional.
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O Estado do Rio Grande do Sul recentemente ajuizou a Ação Cível Originária nº 1182, em que prentende que esta contribuição não incida sobre os valores creditados aos servidores da Secretaria da Agricultura a título de abono família, auxílio transporte, diárias e vale-refeição, por exemplo. Este é o teor da notícia publicada no site do STF no último dia 06/06/2008, abaixo transcrita:
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Governo do Rio Grande do Sul contesta no Supremo cobranças do INSS
O governo do Rio Grande do Sul ajuizou Ação Cível Originária (ACO 1182) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra cobranças do INSS relativas a contribuições previdenciárias incidentes em folhas de pagamento da Secretaria da Agricultura do estado. O objetivo é suspender o pagamento desses créditos tributários ou impedir que o estado seja incluído no Cadin (Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal), fato que inviabiliza o recebimento de verbas federais. No mérito, o governo gaúcho pretende que os créditos fiscais em benefício do INSS sejam anulados.
Segundo o governo gaúcho, as cobranças são ilegais e estão em desacordo com parecer da Advocacia Geral da União (AGU) e da Procuradoria Federal. Algumas das cobranças, diz o governo, incidem em parcelas de caráter não remuneratório, pagas em conformidade com a legislação própria, tais como abono família, auxílio transporte, diárias e vale refeição.
Outras cobranças, de acordo com o governo gaúcho, são feitas com base em contribuições previdenciárias de servidores públicos estaduais transpostos que mantêm vínculo de natureza estatutária com o estado. Segundo o governo, nesses casos, “o INSS confunde ocupante de cargo em comissão com servidor público estatutário no exercício de uma função gratificada”, sem se preocupar em verificar as situações funcionais específicas de cada servidor.
O governo afirma, na ação, que essas autuações do INSS são sempre contestadas na instância administrativa, mas que, em suas manifestações, “a autarquia previdenciária revela uma extrema má-vontade: não investiga as situações funcionais, não investiga o fundamento legal pelo qual são pagas vantagens aos servidores”.
Outra queixa do governo é quanto à forma que a autarquia lança os dados na peça fiscal de cobrança, sem arrolar os nomes dos servidores, a natureza do vínculo deles com o estado, enfim, sem particularizar as situações e fornecer dados necessários para que o governo possa analisar e, eventualmente, contestar devidamente as cobranças.
A relatora é a ministra Ellen Gracie.
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Certamente esta ação reproduz os fundamentos das ações ajuizadas aos milhares pelas empresas e demonstra que a insatisfação com a Receita Federal do Brasil supera a iniciativa privada, pelo menos no que diz com a contribuição exigida sobre a folha de salários e devida ao INSS.

Projeto de lei veda a inscrição de contribuintes em débito nos órgãos de proteção ao crédito

Há quase três meses publicávamos as razões que fundamentam a inconstitucionalidade do art. 46 da Lei 11.457/2007, que autoriza a Fazenda Nacional a celebrar convênios com órgãos de proteção ao crédito com o objetivo de compelir o contribuinte a efetuar o pagamento do que a Fazenda entende como devido.
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Destacamos que a expropriação do patrimônio privado tendo em vista a cobrança do tributo deve seguir um procedimento rigidamente delineado, que é decorrência lógica dos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, da legalidade e do livre exercício das atividades. É que a previsão de liquidez, certeza e exigibilidade do crédito tributário é relativa, podendo se desfazer por meio de processo judicial e/ou administrativo. Nesse sentido, a inscrição caracteriza meio de coação e, portanto, via transversa de cobrança, o que o STF já assentou ser inconstitucional, conforme as suas Súmulas 70, 323 e 547. Além disso, é clara quebra de sigilo fiscal. Da mesma forma, não pode a Fazenda Pública se afastar dos procedimentos prescritos na Lei de Execuções Fiscais (Lei 6.830/80) para realizar seus créditos.
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Pois no último dia 06/06/2008 a Agência Câmara veiculou a seguinte notícia: Projeto proíbe inclusão de devedor de imposto no SPC. Segundo esta nota, o Projeto de Lei nº 2825/08, do deputado Moreira Mendes (PPS-RO), prevê a revogação do art. 46 da Lei 11.457/2007, desautorizando a Fazenda Nacional a celebrar convênios com entidades de proteção ao crédito. A justificativa para o projeto tem por fundamento os mesmos argumentos acima delineados.
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Trata-se de medida salutar, que exclui do sistema legislação claramente inconstitucional, evitando o constrangimento dos contribuintes com a inscriação e a necessidade de propositura de ações visando a declaração de inconstitucionalidade desta disposição legal.
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Espera-se que tal projeto seja rapidamente aprovado e que sábias medidas como esta passem a ser regra no seio de nosso Congresso Nacional.

domingo, 8 de junho de 2008

Contribuição patronal ao INSS e afastamento do empregado em razão de doença ou acidente de trabalho

Uma tese tributária há bastante tempo debatida nos Tribunais e que traz sensível economia aos cofres da empresa, mas que é desconhecida por muitas dessas, diz respeito à não-incidência da contribuição patronal destinada ao INSS sobre os primeiros quinze dias de afastamento do empregado em razão de doença ou acidente de trabalho.
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Conforme os arts. 22, inciso I, e 28, inciso I, da Lei 8.212/91, a contribuição previdenciária a cargo do empregador incide apenas sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, destinadas a retribuir o trabalho.
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Portanto, se o pagamento ao empregado se dá por outra finalidade que não a de retribuir o trabalho, não há falar em incidência da contribuição sobre a folha de salários.
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Ocorre que o INSS vem exigindo o pagamento dessa contribuição sobre os primeiros quinze dias de afastamento do empregado em razão de auxílio doença ou acidente do trabalho, cuja responsabilidade pelo pagamento é do empregador. Entretanto, quando está o empregado afastado do trabalho por motivo de doença ou acidente incapacitante (durante os primeiros quinze dias) não está prestando trabalho, usufrui apenas de um benefício destinado a garantir o seu sustento pelo período que perdurar a incapacidade. Trata-se, por isso, de benefício assistencial e não salarial. Nesse sentido é a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
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TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. "AUXÍLIO-CRECHE". "AUXÍLIO-DOENÇA". REEMBOLSO COM DESPESAS MÉDICAS. NATUREZA SALARIAL.NÃO-CONFIGURAÇÃO.1. O auxílio-creche não remunera o trabalhador, mas o indeniza pelo fato de a empresa não manter creche funcionando em seu estabelecimento, de tal modo que, por ser considerado ressarcimento, não integra o salário-de-contribuição, base de cálculo da contribuição previdenciária.2. Ante a não-configuração de natureza salarial, as verbas recebidas pelo empregado nos quinze primeiros dias de afastamento por motivo de doença não sofrem incidência de contribuição previdenciária.3. As parcelas pagas ao empregado como ressarcimento de despesas médicas não atraem a incidência da contribuição previdenciária por expressa previsão legal. Art. 28, § 9º, do Decreto n. 2.172/97.4. Recurso especial não-provido. (REsp 381181/RS, STJ, Segunda Turma, Relator Min. João Otávio Noronha, julgado em 06/04/2006, publicado no DJ em 25/05/2006)
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Assim, aquelas empresas que vêm pagando ou pagaram a contribuição previdenciária sobre os primeiros quinze dias de afastamento do empregado por motivo de doença ou acidente incapacitante podem obter judicialmente a devolução destes valores ou a compensação com contribuições a vencer.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

Transporte Coletivo de Passageiros: inconstitucionalidade e ilegalidade da tributação não-cumulativa pelo PIS/COFINS

Na data de 11 de fevereiro de 2008 foi publicado o Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 23, que determina que as receitas auferidas por empresas que prestem o serviço de transporte coletivo de passageiros por fretamento ou turístico estão sujeitas à tributação não-cumulativa do PIS/COFINS, diferentemente do que ocorre com as empresas que prestam o serviço de transporte coletivo público de passageiros.
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Na primeira modalidade, a prestação do serviço ocorre em regime de Direito Privado, em que um particular contrata a empresa para a realização de determinado transporte, com o preço livremente pactuado entre as partes. Já na segunda modalidade, a empresa atua como permissionária ou concessionária do Poder Público, executando o transporte coletivo em linhas regulares e de caráter essencial. A prestação desta espécie de serviço é regulada pelo Direito Público, sendo que a autorização para a sua prestação depende de prévio procedimento licitatório. A remuneração se dá por meio de tarifas, cujo valor e critério de reajuste dependem do que foi estabelecido em contrato administrativo. Assim, a contar da publicação do citado Ato Declaratório Interpretativo, as primeiras devem ser tributadas pelo sistema não-cumulativo do PIS/COFINS e as segundas segundo o sistema cumulativo. Aquelas empresas que prestem ambos os serviços deverão segregar tais receitas e aplicar o regime competente a cada uma delas.
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Todavia, o Ato Declaratório Interpretativo RFB nº 23/2008 não ultrapassa o primeiro exame de sua legalidade e constitucionalidade.
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Com efeito, o art. 10, inciso XII, da Lei 10.833/03 prevê que as receitas decorrentes de prestação de serviços de transporte coletivo rodoviário, metroviário, ferroviário e aquaviário de passageiros permanecem sujeitas ao regime cumulativo do PIS/COFINS, sem fazer qualquer distinção entre transporte público ou por fretamento/turístico.
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Ora, se a lei não faz qualquer distinção, não é dado a Receita Federal assim fazê-lo. Tal entendimento viola um dos mais básicos brocardos jurídicos, qual seja, Ubi Lex Non Distinguit Nec Nos Distinguire Debemus (em bom português: onde a lei não distingue, não pode o intérprete fazer distinções). A Lei nº 10.833/03 aplica indistintamente o regime cumulativo de tributação do PIS/COFINS às empresas de transporte coletivo de passageiros, indepentemente da forma pela qual é prestado este serviço. Não há um artigo, um parágrafo, um inciso, uma alínea, uma palavra sequer a alicerçar entendimento em contrário, salvo o exercício de imaginação daqueles que pretendem abarrotar cada vez mais os cofres públicos, ainda que à margem da legalidade. Isto porque este Ato Declaratório Interpretativo extrapolou a sua competência, criando situações sem qualquer espécie de previsão legal ou respaldo no mundo jurídico. Assim o fazendo, violou o "Princípio da Legalidade", insculpido nos arts. 5°, inciso II, e 150, inciso I, ambos da Constituição Federal e no art. 97 do CTN.
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A intenção da Receita Federal ao fazer esta distinção é simplesmente promover o aumento da arrecadação. Consabido é que o maior custo dos prestadores de serviços está na folha de salários, isto é, no pagamento dos profissionais que permitem à empresa desenvolver a sua atividade. Como tais pagamentos não geram créditos de PIS/COFINS, a migração para o sistema não-cumulativo acarretará a efetiva elevação da carga tributária dos prestadores de serviços, uma vez que estes fazem pouca utilização daqueles insumos que legalmente autorizam o creditamento.
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A prestação de serviços compreende, geralmente, uma única operação, caracterizando-se pela ausência de uma cadeia de produção longa tal qual se verifica nas atividades industriais e comerciais, em que ocorrem várias etapas até que o produto industrializado chegue às mãos do consumidor final. Em outras palavras, a prestação serviços é iniciada e concluída numa mesma etapa, sendo realizada diretamente pelo prestador ao destinatário final do serviço, sem intermediações. O que existe é uma relação única entre o prestador e tomador do serviço prestado, não existindo qualquer relação anterior a esta. Por este motivo, os contribuintes que atuam neste setor da economia não acumulam créditos significativos.
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Assim, a migração de parte das receitas dos transportadores coletivos de passageiros para o regime não-cumulativo produzirá inconstitucional e ilegal elevação da carga tributária. Antes do Ato Declaratório Interpretativo, a COFINS incidia à alíquota de 3% sobre todas as receitas dos tranportadores coletivos de passageiros. Passando para a não-cumulatividade, este percentual aumentou para 7,6%, o que corresponde a um aumento de 153,33% em sua carga tributária. O mesmo ocorreu com o PIS, cuja alíquota passou de 0,65% para 1,65%, aumento correspondente a 107,25%. Certamente, para evitar tal distorção é que todas as receitas decorrentes do transporte coletivo de passageiros, sem distinção, permaneceram legalmente no regime cumulativo do PIS/COFINS, diversamente do que entende a Receita Federal.
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Agora, espera-se que o Poder Judiciário atenda às expectivas, excluindo do sistema as ilegalidades e inconstitucionalidades constatadas.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Microempresas e Empresas de Pequeno Porte: transferência de créditos de ICMS e IPI

Há algumas semanas publicamos a postagem intitulada: Projeto de Lei Complementar autoriza Microempresas e Empresas de Pequeno Porte a transferirem créditos. Na época, alertamos para as danosas conseqüências patrocinadas pelo art. 23 da Lei Complementar n.º 123/06, que veda a transferência de créditos por estes estabelecimentos, e louvamos o Projeto de Lei Complementar nº 111/2007, que revoga aquele dispositivo.
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Pois na data de hoje (18/04/2008), a Câmara dos Deputados publicou em seu site oficial notícia dando conta de que este Projeto foi aprovado pela Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio. Agora, aguarda-se a sua apreciação pelas comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ). Após, será o Projeto submetido ao Plenário.

Redução do prazo qüinqüenal para o lançamento tributário

O lançamento tributário é o ato pelo qual a Administração Pública constitui o crédito tributário, o que quer dizer, a partir do lançamento o crédito tributário torna-se exigível, podendo o Ente Público exigir do contribuinte o valor apurado a título de tributo.
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Em regra, a Administração dispõe do prazo de 5 (cinco) para realizar este lançamento, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado ou da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado, conforme art. 173, incisos I e II, do Código Tributário Nacional. Já nos caso em que o contribuinte apura e realiza antecipadamente o pagamento do tributo, procedimento que se sujeita a posterior homologação ou não do Autoridade Pública (lançamento por homologação), o entendimento majoritariamente adotado na jurisprudência é o de que o prazo para o lançamento tem como termo inicial a data do fato gerador (art. 150, § 4º, do Código Tributário Nacional), ou seja, a data em que o contribuinte realizou o comportamento descrito na norma jurídica de incidência tributária. Se a Administração Pública não efetua o lançamento dentro destes prazos, perderá ela o direito de receber o tributo.
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Em que pese esta rasteira explanação sobre o lançamento tributário, a intenção aqui não é a de tratar objetivamente sobre o que é e quais são as suas modalidades, mas apenas para divulgar o interessante Projeto de Lei Complementar nº 129/2007, de autoria do Deputado Guilherme Campos (DEM-SP), que tramita na Câmara dos Deputados, e que reduz para 2 (dois) anos os prazos para a realização do lançamento.
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O mais interessante, contudo, é a justificativa para a redução do prazo. Segundo o parlamentar, a celeridade é característica da nossa época, sendo que a informática não mais permite que o tributo aguarde por longos cinco anos para ter certeza se a sua conduta fiscal foi correta.
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Parece que o Deputado tem razão nas justificativas de seu projeto. É que proliferam cada vez mais as medidas tendentes a transferir os ônus da apuração, pagamento e até mesmo do lançamento do tributo ao contribuinte. Veja-se que dentro de pouco tempo os órgãos de fiscalização e arrecadação tributária não necessitarão mais de fiscais ou de auditores, uma vez que já está o contribuinte, por meio de uma infindável série de obrigações acessórias (apresentação de declarações, escrituração, emissão de guias, apuração do tributo, recolhimento...), realizando grande parte do trabalho destes.
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A principal conseqüência da aprovação deste Projeto é que nos procedimentos de fiscalização realizados dentro das empresas só poderão ser exigidos os tributos que não foram pagos nos dois anos anteriores a esta fiscalização e não mais nos últimos cinco anos, como atualmente ocorre.
Assim, a redução do prazo decadencial para o lançamento de tributos é medida salutar e que deve ser saudada por todos os cidadãos brasileiros. Espera-se agora a rápida tramitação e aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 129/2007.

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Curso Gestão Estratégica de Departamentos Jurídicos e Escritórios de Advocacia

Inicia-se na próxima semana (24/04) o Curso Gestão Estratégica de Departamentos Jurídicos e Escritórios de Advocacia, promovido pelos advogados André de Vasconcellos Chaves e Lucas Cassiano. O curso conta com o apoio da Unisinos, uma das maiores universidades do sul do país.
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O seu principal objetivo é orientar os advogados e gestores jurídicos a pensar a advocacia como um negócio e a estruturar seus escritórios ou departamentos jurídicos com formato empresarial, otimizando a utilização de seus recursos e a captação de clientes.
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A nominata de professores conta com os maiores conhecedores da área no Brasil, destacando-se Rodrigo Bertozzi, Lara Selem, Marco Antonio P. Gonçalves e Ronaldo Veirano.
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Para inscrições e maiores informações, clique aqui.

quarta-feira, 16 de abril de 2008

Advogado Andrei Cassiano conversa com advogados de Viamão a respeito do ISS incidente sobre os profissionais autônomos

Na próxima quinta-feira, dia 17/04, o advogado Andrei Cassiano palestrará na OAB de Viamão/RS a respeito da incidência do ISS sobre a atividade desenvolvida pelos profissionais autônomos.
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O encontro terá por objetivo analisar as recentes autuações da Secretaria da Fazenda daquele Município sobre a atividade advocatícia.

sexta-feira, 11 de abril de 2008

Não-incidência da contribuição previdenciária sobre as parcelas pagas como custeio de curso superior aos empregados

Vem causando grande celeuma no meio empresarial nacional o fato de a Receita Federal do Brasil entender que os gastos das empresas com a formação superior de seus funcionários sujeitam-se à incidência da contribuição previdenciária. Melhor explicando: sobre o chamado "auxílio-educação" que a empresa alcança ao empregado para pagar a sua faculdade deve obrigatoriamente incidir a contribuição previdenciária sobre a folha de salários. Diversos são as autuações realizadas nesse sentido, que, invariavelmente, vem acompanhadas de pesadas multas.
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Na interpretação da Fazenda, a isenção constante do art. 28, § 9º, alínea t, da Lei 8.212/91, dirige-se apenas às parcelas pagas e destinadas a custear a educação básica (ensino fudamental e ensino médio) e os cursos de capacitação e qualificação profissional, desde que ligados à atividade desenvolvida pela empresa.
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Entretanto, o dispositivo legal acima referido não deve ter o estreito alcance emprestado pelo Fisco. Com efeito, a finalidade do art. 28, § 9º, alínea t, da Lei 8.212/91 é a de facilitar o acesso dos empregados e trabalhadores em geral ao ensino e a educação, possibilitando assim o seu aperfeiçoamento e a evolução dentro do mercado de trabalho e da própria empresa, através de sucessivas promoções. Assim fazendo, incentiva a empresa a financiar os estudos e o aperfeiçoamento de seus empregados, além de suprir a reconhecida deficiência do Estado em prestar este serviço público. É que por meio deste incentivo o Estado desincumbe-se de criar maior número de vagas em instituições públicas e de prover às suas expensas a educação da população. Tal encargo é repassado à iniciativa privada, que gozará de benefício fiscal sempre que auxiliar na formação educacional de seu empregado.
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Por esta razão, tais importâncias não devem ser incluídas no salário-de-contribuição, até mesmo porque este é composto apenas e tão-somente das importâncias pagas, devidas ou creditadas destinadas a retribuir o trabalho, conforme o art. 28, inciso I, da Lei 8.212/91.
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A própria Consolidação das Leis do Trabalho – CLT é clara ao determinar que os pagamentos efetuados a título de ensino não constituem salário, conforme se depreende de seu art. 458, § 2º, inciso II.
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A toda evidência, devem ser preservados os conceitos do Direito do Trabalho. A CLT é clara quando exclui a natureza salarial de gastos da empresa com a formação acadêmica do empregado, não fazendo distinção entre os níveis fundamental, médio e superior, o que também não ocorre na Lei 8.212/91, como acima já demonstrado.
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Considerar o custeio do ensino superior como salário é verdadeiro absurdo. Imagine a seguinte situação: o empregado desiste de cursar a Faculdade. Deveria, assim, devolver o que recebeu para custeio do curso ao seu empregador. Então, ele ingressa com reclamatória trabalhista perante a Justiça do Trabalho, postulando o reconhecimento de que as referidas parcelas, por serem salário indireto “in natura”, incorporaram-se à sua remuneração, configurando redução salarial vedada pela CLT a sua supressão. Em caso de procedência desta suposta ação, ocorreria a absurda situação do empregador ser obrigado a custear a Faculdade para o empregado até o término do curso, mesmo que ele tenha desistido. Ou, justamente por ele ter desistido, seriam os valores correspondentes a cada semestre integrados no salário do empregado.
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Por isso, há de ser dito que a interpretação que a fiscalização faz do art. 28, § 9º, alínea t, da Lei n.º 8.212/91, vai na contramão da busca da qualificação profissional do indivíduo e de uma sociedade mais justa, ao vedar que possa o trabalhador cursar o ensino superior às expensas de seu empregador.
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O próprio Superior Tribunal de Justiça já decidiu que não incide a contribuição previdenciária na hipótese, conforme o seguinte precedente:
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PREVIDENCIÁRIO. SALÁRIO DE CONTRIBUIÇÃO. VERBAS CREDITADAS A TÍTULO DE AUXÍLIO EDUCAÇÃO E AUXÍLIO MATRIMÔNIO.
1. 'O auxílio-educação, embora contenha valor econômico, constitui investimento na qualificação de empregados, não podendo ser considerado como salário in natura, porquanto não retribui o trabalho efetivo, não integrando, desse modo, a remuneração do empregado. É verba empregada para o trabalho, e não pelo trabalho.' (RESP 324.178-PR, Relatora Min. Denise Arruda, DJ de 17.12.2004).
2. In casu, o auxílio-educação é pago pela empresa em forma de reembolso das mensalidades da faculdade, cursos de línguas e outros do gênero, destinados ao aperfeiçoamento dos seus empregados. Precedentes: REsp 324178⁄PR, 1ª T., Rel. Min. Denise Arruda, DJ. 17.02.2004; AgRg no REsp 328602⁄RS 1ª T., Rel. Min. Francisco Falcão, DJ.02.12.2002; REsp 365398⁄RS 1ª T., Rel. Min. José Delgado, DJ. 18.03.2002.
3. O auxílio matrimônio, fornecido uma única vez ao empregado, por ocasião de suas primeiras núpcias, não integra o salário-de-contribuição, porquanto ausente a habitualidade do seu pagamento.4. Recurso Especial provido.” (Primeira Turma, REsp n. 676.627⁄PRII, Min. Luiz Fux, DJ de 9.5.2005).
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Dessa forma, não procedem as autuações da Receita Federal do Brasil, na medida em todo e qualquer investimento na qualificação de empregados não deve ser considerado salário.

terça-feira, 18 de março de 2008

Projeto de Lei Complementar autoriza Microempresas e Empresas de Pequeno Porte a transferirem créditos

Questão que já há algum tempo vem sendo debatida é a vedação à apropriação e a transferência de créditos relativos a impostos e contribuições por parte das microempresas e das empresas de pequeno porte enquadradas no Simples Nacional, conforme o art. 23 da Lei Complementar n.º 123/06.

Pela interpretação literal deste dispositivo, todas aquelas empresas que vierem a negociar com microempresas e empresas de pequeno porte estariam impedidas de tomar créditos de ICMS, IPI, PIS e COFINS. O problema da vedação ao crédito de PIS/COFINS foi composto pelo Ato Declaratório Interpretativo n.º 15 da Receita Federal do Brasil, que autorizou a apropriação. Remanesce a questão relativa ao ICMS e ao IPI.

Entretanto, é importante referir que essa vedação não se sustenta juridicamente. Primeiro, porque a não-cumulatividade do ICMS, que pressupõe a transferência de créditos, é uma garantia constitucional que não pode ser amesquinhada por legislação infraconstitucional, conforme art. 155, § 2º, inciso I, da Constituição Federal. Segundo, porque a vedação ao creditamento importaria excluir as microempresas e as empresas de pequeno porte da cadeia negocial, uma vez que nenhum estabelecimento comercial irá ter por fornecedor uma empresa que não lhe permita a tomada de crédito nas mercadorias adquiridas. Tal situação acabaria por elevar o preço final das mercadorias que comercializa, diminuindo o seu valor competitivo. Terceiro, porque a vedação ao crédito faz com que o ICMS incida sobre o faturamento e não sobre a operação de circulação de mercadorias.

A boa notícia é que nem só os estudiosos do Direito Tributário se aperceberam das inconstitucionalidades e das incongruências acima referidas. É que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar nº 111/2007, que tem por finalidade, além de outras disposições, a revogação do art. 23 da Lei Complementar nº 123/2006, permitindo, assim, que estas empresas tomem e transfiram todo e qualquer crédito. Nesse sentido, a aprovação deste projeto representaria importante avanço no que toca ao regime de tributação simplificada. Neste mesmo pacote está incluída a revogação do art. 24 da mesma lei complementar, que impede o acesso das micro e pequenas empresas a incentivos fiscais. Se o objetivo desta legislação é o de favorecer os pequenos empreendedores, porque excluí-los dos benefícios fiscais? Obviamente não há resposta plausível para esta questão.

O Projeto de Lei Complementar nº 111/2007 é uma medida louvável do legislador nacional, tanto criticado pela sociedade brasileira. Agora, espera-se a rápida tramitação e aprovação do Projeto e que atitudes como esta possam se repetir, não constituindo um mero fato isolado.

sábado, 15 de março de 2008

Impossibilidade de se condicionar o deferimento de liminares ao depósito integral do tributo devido

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei Complementar n.º 75/2003, que altera o art. 151, incisos IV e V, do Código Tributário Nacional (CTN) para condicionar a concessão de liminares em ações judiciais tributárias ao depósito integral do tributo supostamente devido.

O que mais impressiona, contudo, é a justificativa do Deputado Eduardo Cunha para o projeto de lei apresentado, que transcrevemos:

"Consagrada pelo direito consuetudinário nacional, a tutela antecipada de tributos ou contribuições municipais, estaduais ou federais vem, ao longo do tempo mostrando-se injusta e claramente lesiva aos interesses tanto do contribuinte quanto do Poder Executivo. É sabido que existe uma indústria de liminares no País, inclusive objetos de uma investigação por Comissão Parlamentar de Inquérito sobre combustíveis, onde Empresas obtém tutelas antecipadas, comercializando produtos ficam com dinheiro dos tributos e contribuintes, e ao fim essas empresas somem sem nenhuma possibilidade do Poder Público reaver esse dinheiro. O estabelecimento do depósito judicial para concessão da tutela antecipada ou liminar impedirá a sangria aos cofres públicos."

A justificativa beira ao absurdo. Defender que a concessão de tutela antecipada em ações judiciais é injusta e lesiva aos cofres públicos demonstra a ausência de conhecimento mínimo do sistema jurídico nacional. É que os provimentos liminares, decisões proferidas logo no início do processo, gênero no qual se enquadra a tutela antecipada, devem ser deferidas apenas como exceção, o que quer dizer, apenas quando demonstrados pelo postulante todos os requisitos necessários ao seu deferimento. Aliás, quase que a unanimidade dos juízes têm sido extremamente criteriosa na análise destes requisitos. Como se isso não bastasse, o provimento liminar é um direito garantido constitucionalmente, que decorre diretamente dos princípios do livre acesso ao judiciário, da inafastabilidade da apreciação pelo Poder Judiciário, do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, todos previstos no art. 5º da Constituição Federal. É direito constitucional do contribuinte a obtenção de provimento liminar em qualquer ação que seja independentemente de depósito. Além disso, é obrigatório o deferimento da medida antecipatória quando cumpridos os requisitos legais. A justificativa ainda põe em cheque a credibilidade e a honestidade do Poder Judiciário, ao afirmar que existe uma indústria de liminares. Neste ponto é importante dizer que se há indústria de liminares é porque existe produto para tanto. E não calha dizer que as empresas somem sem que possa o Poder Público reaver o dinheiro dos supostos tributos indevidos. Aos milhões são os casos em que as execuções fiscais têm sido redirecionadas contra sócios e ex-sócios, inclusive aqueles que não constam da Certidão de Dívida Ativa. Além disso, cumpre referir que a sangria é cometida diariamente no bolso do contribuinte, que despende mais de 50% de seu rendimento anual em tributos, cujo retorno em serviços públicos é quase que imperceptível.

Em que pese a crítica ao Projeto que tramita no Congresso, grande parte dos juízes e desembargadores federais já tem adotado este entendimento e não concedem liminar ou tutela antecipada sem que o contribuinte deposite o valor integral do tributo questionado. Entretanto, em poucas linhas pode-se demonstrar o equívoco deste entendimento.

Presentes nos autos do mandado de segurança ou nas ações declaratórias e anulatórias os pressupostos para o deferimento da medida liminar, não pode o juiz exigir o depósito do montante integral do tributo. Primeiramente, porque o art. 7º, inciso II, da Lei 1.533/51 é claro ao listar como requisitos ao deferimento da medida liminar em mandado de segurança apenas e tão-somente a relevância do fundamento e possibilidade de ineficácia da ação acaso não deferida. Já para a tutela antecipada, descrita no art. 273 do Código de Processo Civil, os pressupostos são a prova inequívoca, a verossimilhança da alegação, o abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu, o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação e a reversibilidade da medida. Como se vê, em nenhuma das hipóteses se inclui o depósito do montante integral. Segundo, porque presentes os requisitos, está o juiz obrigado ao deferimento da liminar ou da tutela antecipada, entendimento que decorre da mesma disposição legal acima referida. Terceiro, porque o depósito do montante integral e o deferimento de liminar ou tutela antecipada são causas autônomas que suspendem a exigibilidade do crédito tributário, não sendo lógica a cumulação destes dois meios. Ambos têm a mesma finalidade, qual seja, suspender os atos de cobrança efetivados pelo Fisco.

Com relação ao mandado de segurança, cumpre referir que a exigência do depósito para que deferida a medida liminar esvazia por completo a sua utilidade, que se centra justamente no fato de autorizar a discussão do crédito tributário sem que tenha o impetrante/contribuinte de despir-se de seus bens ou de correr o risco de ser executado pelo Fisco. O depósito retira esta utilidade, na medida em que por si só já suspende a exigibilidade do crédito tributário. Portanto, ou se defere a liminar suspendendo o ato ou se deposita o valor controvertido, posto que ausente qualquer justificativa prática, lógica ou legal que imponha a sua cumulação.

Assim, espera-se que o Projeto de Lei Complementar n.º 75/2003 não evolua, sob pena de mais uma vez restarem afrontados os direitos garantidos constitucionalmente aos contribuintes.