Entra as modificações introduzidas pela
Medida Provisória n° 449/2008, uma em particular poderá causar severos prejuízos às empresas tributadas com base no lucro real que optaram por realizar o pagamento mensal do IRPJ e da CSLL sobre a base de cálculo estimada no exercício de 2008, na forma do que faculta o
art. 2° da Lei 9.430/96.
Trata-se do art. 29 da referida Medida Provisória, que incluiu o inciso IX ao § 3° do art. 74 da Lei 9.430/96, e que expressamente veda sejam objeto de compensação
"os débitos relativos ao pagamento mensal por estimativa do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL apurados". A partir dessa alteração, todas as empresas tributadas com base na estimativa mensal que, ao final do exercício, apurarem prejuízo, isto é, recolheram IRPJ e CSLL em valor superior ao que deveriam ter recolhido relativamente ao que foi apurado no fechamento final do balanço,
não poderão utilizar os valores pagos a maior como crédito para compensar com débitos próprios de IRPJ e CSLL.Entretanto, sem um exame mais aprofundado, podemos apontar algumas inconstitucionalidades e ilegalidades que permeiam a nova previsão. Inicialmente, há de ser dito que o direito ao crédito tributário, como qualquer outro crédito, se incorpora ao patrimônio de seu titular, sendo, portanto, de sua propriedade. Ora, se o crédito tributário de titularidade do sujeito passivo compõe o seu patrimônio, ou melhor, é de sua
prorpriedade, trata-se, por isso, de verdadeiro direito fundamental, protegido pelo art. 5°,
caput e inciso XII, da Constituição Federal, cujo exercício não pode ser restringido por legislação infraconstitucional. Ademais, a prática comumentemente adotada pelo Poder Público de ser devedor de determinado sujeito passivo e exigir o pagamento de seus créditos em dinheiro deste mesmo sujeito passivo, vedando a compensação, passa muito além do Princípio da Moralidade Administrativa, que é de observância obrigatória, conforme
art. 37 da Constituição Federal. Além disso, inexiste qualquer justificativa plausível para vedação à compensação estabelecida, estando a nova previsão desprovida de qualquer razoabilidade.
Na mesma linha, a impossibilidade de realizar a compensação faz com que o Imposto de Renda passe a gravar a receita, situação que não se coaduna com a regra constitucional que autoriza a incidência desse imposto sobre a "renda", entendida como o acréscimo patrimonial verificado em determinado período. Da mesma forma, a alíquota efetivamente praticada, tendo-se em vista a impossibilidade de compensação, passa a ser muito maior que a legalmente prevista. O direito de compensção ainda é da própria técnica de apuração do IRPJ e da CSLL. A nova regra, por isso, mais assemelha-se a confisco.
Não fosse isso suficiente, a aplicação imediata da nova legislação viola os princípios da segurança jurídica e da não-surpresa do contribuinte, uma vez que este já estava preparado para realizar a compensação como sempre fez, sendo, portanto, inconstitucional a "modificação da regra no meio do jogo". Também há violação aos princípios da anterioridade e da anterioridade nonagesimal. Na forma da jurisprudência do STF (ADIn-MC 2325),
"toda modificação legislativa que, de maneira direta ou indireta, implicar carga tributária maior há de ter eficácia no ano subseqüente àquele no qual veio a ser feita", sendo que a vedação ao aproveitamento de crédito legitimamente auferido caracteriza efetivo aumento da carga tributária. Por isso, o dispositivo em questão deve respeitar os princípios constitucionais da anterioridade e da anterioridade nonagesimal.
A toda evidência, o art. 74, § 3°, inciso IX, da Lei 9.430/96, incluído pela MP 449/2008, pode e deve ser questionado perante o Poder Judiciário.