Há algum tempo temos defendido a possibilidade de as microempresas e as empresas de pequeno porte em débito com a União, Estados ou Municípios aderirem ao novo Simples Nacional independentemente de parcelamento, desde que a exigibilidade do crédito tributário esteja suspensa. Sobre este tema escrevemos o artigo intitulado SUPERSIMPLES: Contribuintes com débito poderão aderir ao Simples Nacional.
Conforme o art. 151 do Código Tributário Nacional, o crédito tributário pode ser suspenso pela moratória, pelo depósito integral do valor do débito, pela presença de defesa ou recurso em processo administrativo, pela concessão de liminares em ações judiciais ou por parcelamento anterior (REFIS, PAEX...).
A suspensão da exigibilidade tem o efeito de impedir o início ou a continuação do procedimento de cobrança do crédito tributário por parte do Fisco, dependendo do momento em que se verificar qualquer uma das causas suspensivas referidas no art. 151 do Código Tributário Nacional. Se a causa de suspensão se efetiva antes do lançamento, impede-se o lançamento e todos os atos daí decorrentes, excetuando-se o lançamento realizado com o único fim de prevenir a decadência. Se já houve o lançamento e sobrevém causa suspensiva da exigibilidade do crédito tributário, impede-se que seja levado a efeito o ato de inscrição em dívida ativa. Se a dívida já se encontra inscrita, a suspensão do crédito tributário impede a propositura da execução fiscal.
Logo, os débitos cuja exigibilidade esteja suspensa não podem ser cobrados pelas Fazendas Federal, Estaduais ou Municipais. Nesse sentido, havíamos defendido naquela oportunidade que obrigar aos contribuintes que possuam débitos tributários com exigibilidade suspensa a aderirem a parcelamento para inscrição no Simples Nacional é uma via transversa para obter a quitação da dívida, o que caracteriza ato de cobrança e viola o art. 151 do Código Tributário Nacional. Aí residiria, portanto, a ilegalidade da obrigação de aderir ao parcelamento.
Também constatando este problema, no último dia 02/07/2007 publicou a Receita Federal do Brasil a Instrução Normativa n.º 750, que aparentemente veio a resolver a questão. A solução adotada pela administração foi "SUPERSIMPLES" e está em seu art. 2º: obrigar o contribuinte a desistir expressamente e de forma irrevogável das impugnações ou dos recursos administrativos, dos embargos opostos em execuções fiscais ou de outros tipos de ações judiciais propostas. Mas este ato normativo não parou por aí, foi muito mais além, obriga aqueles que pretendem usufruir do parcelamento a renunciar a quaisquer alegações de direito sobre as quais se fundamentam os processos administrativos e as ações judiciais.
Esta disposição é inconstitucional e ilegal.
É ilegal porque não há qualquer determinação na Lei Complementar n.º 123/06 que obrigue aos microempresários e empresários de pequeno porte a desistirem de processos administrativos e de ações judiciais, bem como do direito em que estes se fundam para aderirem ao parcelamento. Básico para os juristas é o fato de que as instruções normativas são submissas à lei e não obrigam particulares, isto é, não podem instituir novas obrigações além daquelas legalmente previstas. As instruções normativas prestam-se unicamente para pormenorizar as obrigações previstas em lei, permitindo sua fiel execução. Assim, tem-se que o o art. 2° da Instrução Normativa n.º 750 é ilegal.
De outra parte, é inconstitucional porque viola princípios basilares ao Estado Democrático de Direito. O primeiro deles é o do livre acesso ao Judiciário (art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal), segundo o qual a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Se até a mesmo a lei não pode proibir o cidadão de ir a juízo defender seus direitos, muito menos poderia assim proceder uma instrução normativa. Também são violados os princípios do contraditório, da ampla defesa e do direito ao processo administrativo (art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal), uma vez que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Logo, qualquer determinação que implique renúncia ao direito de demandar em juízo ou ao direito a um processo administrativo é inconstitucional.
Vê-se, portanto, que a Receita Federal do Brasil continua a vestir a carapuça de legislador para criar obrigações que só podem ser instituídas mediante lei, o que é claramente inconstitucional e ilegal.
Não podemos deixar de alertar o contribuinte para este fato, que novamente terá de travar uma batalha judicial na tentativa de ver expungida do sistema disposição que está eivada de ilegalidade e inconstitucionalidade.
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