Em razão do panorama econômico atual, de severa instabilidade financeira e retração no mercado, muitas empresas estão requerendo recuperação judicial, com o objetivo de superar a
situação de crise econômico-financeira e permitir a manutenção da fonte
produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses de seus credores.
O próprio Serasa Experian tem divulgado dados dando conta de que os requerimentos de recuperação judicial tem batido o seu recorde histórico neste ano de 2015. De acordo com o Indicador Serasa Experian de Falências e Recuperações, no primeiro semestre de 2015, as recuperações judiciais totalizaram 492 ocorrências, o que se trata de um recorde para o acumulado de um primeiro semestre desde 2006, data da entrada em vigor da nova Lei de Falências e Recuperações Judiciais.
Já para o mês de julho de 2015, o mesmo indicador aponta que foram 135 solicitações, um aumento de 28,6% em relação a junho e o maior volume desde o início da série histórica do indicador, como dito, em 2006. E o que é pior, as micro e pequenas empresas lideraram os requerimentos de janeiro a julho de 2015, com 323 pedidos, seguidas pelas médias (174 pedidos) e pelas grandes empresas (130 pedidos).
Com o incremento dos pedidos de recuperação judicial, é natural que os litígios envolvendo o tema aumentem e se potencializem. E um dos principais pontos de discussão nesses processos diz com a definição do juízo competente para a prática de atos que comprometam o patrimônio da empresa, como penhoras, bloqueios e alienação judicial de bens.
Os arts. 3º e 76 da Lei nº 11.011/2005 estabelecem o princípio da universidade do juízo falimentar, segundo o qual o juízo da recuperação ou falência é o competente para conhecer todas as ações sobre bens, interesses e negócios do falido. O que quer dizer, com o deferimento do pedido, cabe ao juízo da recuperação judicial a prática de todo e qualquer ato que tenha por objeto o patrimônio da empresa em recuperação, inclusive penhoras, bloqueios de numerário e alienação judicial de bens.
Contudo, mesmo com o deferimento da recuperação
judicial, a prática tem demonstrado que os magistrados da Justiça Trabalho continuam determinando o bloqueio e a liberação de valores que deveriam ser transferidos e se submeter ao
processo de Recuperação Judicial em favor de ex-empregados da empresa em recuperação, estabelecendo - indevidamente - uma espécie de competência concorrente com o juízo da recuperação judicial.
Tal situação caracteriza conflito de competência entre juízes de mesma hierarquia vinculados a Tribunais distintos, cuja competência para a resolução é do Superior Tribunal de Justiça (STJ), na forma do art. 105, d, da Constituição Federal e do art. 12, IV, do Regimento Interno do STJ.
Caso configurada essa situação, a empresa em recuperação judicial, como parte interessada, tem legitimidade para suscitar Conflito de Competência ao STJ, objetivando seja declarada a competência do juízo da recuperação para a prática de atos que comprometam o patrimônio da empresa, como penhoras, bloqueios e alienação judicial de bens, sendo que o STJ tem reiteradamente decidido que tal competência é, de fato, do juízo da recuperação judicial.
Exemplo desse entendimento é o Conflito de Competência nº 138362, onde o Ministro Raul Araújo, integrante da 2ª Seção do
Superior Tribunal de Justiça, deferiu a liminar para “determinar o sobrestamento
dos atos de constrição de bens e direitos de titularidade da suscitante
(empresa em Recuperação Judicial), na
ação trabalhista movida (...), vedado o levantamento e transferência dos
valores indigitados”.
Ao apreciar o mérito desse Conflito de Competência,
o mesmo Ministro reconheceu a competência do juízo da recuperação judicial para (i) determinar a
forma de pagamento dos créditos trabalhistas e (ii) para decidir acerca dos
bens da empresa, devendo estes bens ser liberados das constrições e colocados à
disposição do Juízo da recuperação, nos seguintes termos:
Assim, é de ser reconhecida a competência do
Juízo da Recuperação para determinar a forma de pagamento dos créditos
trabalhistas, bem como para decidir acerca da destinação dos bens da
recuperanda, que devem ser liberados das constrições efetivadas e colocados à
disposição do Juízo da recuperação, de modo a viabilizar a consecução do plano,
com a manutenção da sociedade empresária em funcionamento.
Tais decisões do STJ são de extrema importância para a
empresa em Recuperação Judicial e para seus credores, inclusive trabalhistas,
na medida em que garantem que todo o patrimônio porventura existente será
utilizado para o cumprimento do Plano de Recuperação Judicial e continuidade da
atividade empresarial.