terça-feira, 18 de março de 2008

Projeto de Lei Complementar autoriza Microempresas e Empresas de Pequeno Porte a transferirem créditos

Questão que já há algum tempo vem sendo debatida é a vedação à apropriação e a transferência de créditos relativos a impostos e contribuições por parte das microempresas e das empresas de pequeno porte enquadradas no Simples Nacional, conforme o art. 23 da Lei Complementar n.º 123/06.

Pela interpretação literal deste dispositivo, todas aquelas empresas que vierem a negociar com microempresas e empresas de pequeno porte estariam impedidas de tomar créditos de ICMS, IPI, PIS e COFINS. O problema da vedação ao crédito de PIS/COFINS foi composto pelo Ato Declaratório Interpretativo n.º 15 da Receita Federal do Brasil, que autorizou a apropriação. Remanesce a questão relativa ao ICMS e ao IPI.

Entretanto, é importante referir que essa vedação não se sustenta juridicamente. Primeiro, porque a não-cumulatividade do ICMS, que pressupõe a transferência de créditos, é uma garantia constitucional que não pode ser amesquinhada por legislação infraconstitucional, conforme art. 155, § 2º, inciso I, da Constituição Federal. Segundo, porque a vedação ao creditamento importaria excluir as microempresas e as empresas de pequeno porte da cadeia negocial, uma vez que nenhum estabelecimento comercial irá ter por fornecedor uma empresa que não lhe permita a tomada de crédito nas mercadorias adquiridas. Tal situação acabaria por elevar o preço final das mercadorias que comercializa, diminuindo o seu valor competitivo. Terceiro, porque a vedação ao crédito faz com que o ICMS incida sobre o faturamento e não sobre a operação de circulação de mercadorias.

A boa notícia é que nem só os estudiosos do Direito Tributário se aperceberam das inconstitucionalidades e das incongruências acima referidas. É que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar nº 111/2007, que tem por finalidade, além de outras disposições, a revogação do art. 23 da Lei Complementar nº 123/2006, permitindo, assim, que estas empresas tomem e transfiram todo e qualquer crédito. Nesse sentido, a aprovação deste projeto representaria importante avanço no que toca ao regime de tributação simplificada. Neste mesmo pacote está incluída a revogação do art. 24 da mesma lei complementar, que impede o acesso das micro e pequenas empresas a incentivos fiscais. Se o objetivo desta legislação é o de favorecer os pequenos empreendedores, porque excluí-los dos benefícios fiscais? Obviamente não há resposta plausível para esta questão.

O Projeto de Lei Complementar nº 111/2007 é uma medida louvável do legislador nacional, tanto criticado pela sociedade brasileira. Agora, espera-se a rápida tramitação e aprovação do Projeto e que atitudes como esta possam se repetir, não constituindo um mero fato isolado.

sábado, 15 de março de 2008

Impossibilidade de se condicionar o deferimento de liminares ao depósito integral do tributo devido

Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei Complementar n.º 75/2003, que altera o art. 151, incisos IV e V, do Código Tributário Nacional (CTN) para condicionar a concessão de liminares em ações judiciais tributárias ao depósito integral do tributo supostamente devido.

O que mais impressiona, contudo, é a justificativa do Deputado Eduardo Cunha para o projeto de lei apresentado, que transcrevemos:

"Consagrada pelo direito consuetudinário nacional, a tutela antecipada de tributos ou contribuições municipais, estaduais ou federais vem, ao longo do tempo mostrando-se injusta e claramente lesiva aos interesses tanto do contribuinte quanto do Poder Executivo. É sabido que existe uma indústria de liminares no País, inclusive objetos de uma investigação por Comissão Parlamentar de Inquérito sobre combustíveis, onde Empresas obtém tutelas antecipadas, comercializando produtos ficam com dinheiro dos tributos e contribuintes, e ao fim essas empresas somem sem nenhuma possibilidade do Poder Público reaver esse dinheiro. O estabelecimento do depósito judicial para concessão da tutela antecipada ou liminar impedirá a sangria aos cofres públicos."

A justificativa beira ao absurdo. Defender que a concessão de tutela antecipada em ações judiciais é injusta e lesiva aos cofres públicos demonstra a ausência de conhecimento mínimo do sistema jurídico nacional. É que os provimentos liminares, decisões proferidas logo no início do processo, gênero no qual se enquadra a tutela antecipada, devem ser deferidas apenas como exceção, o que quer dizer, apenas quando demonstrados pelo postulante todos os requisitos necessários ao seu deferimento. Aliás, quase que a unanimidade dos juízes têm sido extremamente criteriosa na análise destes requisitos. Como se isso não bastasse, o provimento liminar é um direito garantido constitucionalmente, que decorre diretamente dos princípios do livre acesso ao judiciário, da inafastabilidade da apreciação pelo Poder Judiciário, do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, todos previstos no art. 5º da Constituição Federal. É direito constitucional do contribuinte a obtenção de provimento liminar em qualquer ação que seja independentemente de depósito. Além disso, é obrigatório o deferimento da medida antecipatória quando cumpridos os requisitos legais. A justificativa ainda põe em cheque a credibilidade e a honestidade do Poder Judiciário, ao afirmar que existe uma indústria de liminares. Neste ponto é importante dizer que se há indústria de liminares é porque existe produto para tanto. E não calha dizer que as empresas somem sem que possa o Poder Público reaver o dinheiro dos supostos tributos indevidos. Aos milhões são os casos em que as execuções fiscais têm sido redirecionadas contra sócios e ex-sócios, inclusive aqueles que não constam da Certidão de Dívida Ativa. Além disso, cumpre referir que a sangria é cometida diariamente no bolso do contribuinte, que despende mais de 50% de seu rendimento anual em tributos, cujo retorno em serviços públicos é quase que imperceptível.

Em que pese a crítica ao Projeto que tramita no Congresso, grande parte dos juízes e desembargadores federais já tem adotado este entendimento e não concedem liminar ou tutela antecipada sem que o contribuinte deposite o valor integral do tributo questionado. Entretanto, em poucas linhas pode-se demonstrar o equívoco deste entendimento.

Presentes nos autos do mandado de segurança ou nas ações declaratórias e anulatórias os pressupostos para o deferimento da medida liminar, não pode o juiz exigir o depósito do montante integral do tributo. Primeiramente, porque o art. 7º, inciso II, da Lei 1.533/51 é claro ao listar como requisitos ao deferimento da medida liminar em mandado de segurança apenas e tão-somente a relevância do fundamento e possibilidade de ineficácia da ação acaso não deferida. Já para a tutela antecipada, descrita no art. 273 do Código de Processo Civil, os pressupostos são a prova inequívoca, a verossimilhança da alegação, o abuso de direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu, o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação e a reversibilidade da medida. Como se vê, em nenhuma das hipóteses se inclui o depósito do montante integral. Segundo, porque presentes os requisitos, está o juiz obrigado ao deferimento da liminar ou da tutela antecipada, entendimento que decorre da mesma disposição legal acima referida. Terceiro, porque o depósito do montante integral e o deferimento de liminar ou tutela antecipada são causas autônomas que suspendem a exigibilidade do crédito tributário, não sendo lógica a cumulação destes dois meios. Ambos têm a mesma finalidade, qual seja, suspender os atos de cobrança efetivados pelo Fisco.

Com relação ao mandado de segurança, cumpre referir que a exigência do depósito para que deferida a medida liminar esvazia por completo a sua utilidade, que se centra justamente no fato de autorizar a discussão do crédito tributário sem que tenha o impetrante/contribuinte de despir-se de seus bens ou de correr o risco de ser executado pelo Fisco. O depósito retira esta utilidade, na medida em que por si só já suspende a exigibilidade do crédito tributário. Portanto, ou se defere a liminar suspendendo o ato ou se deposita o valor controvertido, posto que ausente qualquer justificativa prática, lógica ou legal que imponha a sua cumulação.

Assim, espera-se que o Projeto de Lei Complementar n.º 75/2003 não evolua, sob pena de mais uma vez restarem afrontados os direitos garantidos constitucionalmente aos contribuintes.

Inscrição dos devedores fiscais nos órgãos de proteção ao crédito: nova indústria de ações judiciais?

Muito se tem discutido a respeito da possibilidade de inscrição dos contribuintes em débito com a Fazenda Nacional nos órgãos privados de proteção ao crédito, como SPC e SERASA. A discussão em sua maioria centra-se na constitucionalidade/legalidade de assim proceder a Procuradoria da Fazenda Nacional.

O principal argumento que conforta a tese daqueles que defendem a possibilidade de inscrição é o de que a medida irá aumentar a arrecadação e diminuir a inadimplência. Sendo os tributos a principal fonte de receita do Estado Nacional e destinando-se a custear a realização do bem comum através da implementação de Direitos Fundamentais do Cidadão, como saúde, educação e moradia, nada mais justo do que agilizar a cobrança destes créditos.

Entretanto, sabe-se que a imposição tributária é e sempre foi a maior manifestação do Poder de Império do Estado, que avança sobre o patrimônio do particular, expropriando-o de acordo com os ditames constitucionais e legais. Aqui se percebe uma mitigação de uma série de princípios e garantias do indivíduo, como a proteção da propriedade privada (art. 5º, caput e incisos XXII e XXIV, da Constituição Federal). Sinale-se que tal mitigação decorre de outros princípios constitucionais implícitos ou explícitos, em especial o da supremacia do interesse público, que, resumidamente, determina a supremacia dos interesses coletivos sobre os individuais. A partir da ponderação de princípios muito bem explicitada por Alexy é que se compõe essa aparente antinomia e se legitima a cobrança dos tributos: em que pese a propriedade privada ser protegida, em certos casos e ao abrigo da constitucionalidade e da legalidade, pode o Poder Público exproriar o patrimônio privado para cumprir com suas metas coletivas e sociais. Sem dúvida, em uma escala valorativa os interesses coletivos sobrepõem-se aos interesses particulares.

Em que pese a supremacia do interesse público sobre o particular, a expropriação do patrimônio privado tendo em vista a cobrança do tributo deve seguir um procedimento rigidamente delineado, decorrência dos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa, da legalidade e do livre exercício das atividades. Aqui se fundamentam as razões daqueles que se opõem à inscrição dos devedores fiscais em órgãos privados de proteção ao crédito. A previsão de liquidez, certeza e exigibilidade do crédito tributário é relativa, podendo-se desfazer por meio de processo judicial e/ou administrativo. Nesse sentido, a inscrição caracterizaria meio de coação e, portanto, via transversa de cobrança, o que o STF já assentou ser inconstitucional, conforme as suas Súmulas 70, 323 e 547. Além disso, é clara quebra de sigilo fiscal.

Com efeito, parece que a razão está com está última posição, que não admite a inscrição, especialmente porque não pode a Fazenda Pública se afastar dos procedimentos prescritos na Lei de Execuções Fiscais (Lei 6.830/80) para realizar seus créditos.

O que grande parte da doutrina não está percebendo é que esta medida irá criar uma nova "avalanche" de ações judiciais, tal qual verificamos nas atuais demandas contra as instituições financeiras e companhias de telefonia pública, que comprovadamente são as empresas mais demandadas em razão da inscrição indevida de consumidores nos órgãos restritivos de crédito.

Podemos apontar duas das principais demandas. O Superior Tribunal de Justiça já tem forte jurisprudência no sentido de que em havendo discussão judicial acerca do débito objeto da inscrição poderá ser deferida liminar determinando a exclusão dos cadastros, desde que concorram os outros requisitos para o provimento cautelar ou tutela antecipada. Não é difícil imaginar a série de ações judiciais que serão propostas utilizando tal entendimento. Enquanto tramitar o processo em que deferida a liminar estarão os contribuintes imunes à negativação.

Na mesma esteira, também não serão poucas as ações objetivando a indenização por dano moral decorrente da inscrição indevida. Consabido é que a negativação do nome dos consumidores no banco de dados dos inadimplentes gera uma série de dificuldades, como realizar compras a prazo ou financiamentos. Não será diferente para os contribuintes indevidamente inscritos no cadastro da Fazenda, que terão grandes dificuldades na obtenção de crédito no mercado e até mesmo em adquirir produtos de fornecedores. Também restarão prejudicados para participar de qualquer licitação ou concorrência pública. Sinale-se que ainda é possível encontrar uma série de execuções fiscais com débitos prescritos e débitos de longa data inscritos em dívida ativa que sequer foram executados. Obviamente que todos os danos daí decorrentes, sejam eles materiais ou morais, haverão de ser indenizados pelo responsável pela negativação, no caso a União.

Vê-se, portanto, que a União, tencionando agilizar a cobrança de seus créditos através do constrangimento do contribuinte, está também criando um grande passivo pecuniário, decorrente das prováveis indenizações que haverá de pagar pela inscrição indevida, bem como de ações judiciais contestando os débitos e a própria inscirção.

A questão será resolvida pelo velho custo-benefício, isto é, se os valores auferidos pela União mediante o constrangimento indevido superarem os ônus das demandas judiciais que terá de suportar terá válido a pena.

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